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O direito constitucional de postular o benefício previdenciário no poder judiciário e as problemáticas processuais

Publicado em 14 de Agosto de 2013 ás 13h 28

Por Henei Rodrigo Berti Casagrande - Advogado

O DIREITO FUNDAMENTAL À TUTELA JURISDICIONAL FRENTE À ANÁLISE DAS CONDIÇÕES DA AÇÃO NO ÂMBITO DO DIREITO PROCESSUAL CONSTITUCIONAL - NEOPROCESSUALISMO

O Estado moderno se fundamenta na clássica tripartição de Poderes idealizada por Montesquieu, desempenhando cada um deles uma função precípua, também denominada de função típica.

Ao Poder Legislativo incumbe a atividade legiferante baseada na inovação do ordenamento jurídico, a fim de disciplinar a vivência em sociedade e ordenar as atividades estatais. Por sua vez, ao Poder Executivo é atribuído a função de implementar os direitos dos cidadãos, através de políticas públicas e atuação de seus órgãos, sempre pautado nos princípios constitucionais e em obediência à lei.

Ao Poder Judiciário, a par de outras prerrogativas, incumbe o dever de fiscalizar a atuação do Legislativo e do Executivo, corrigindo distorções na atuação destes, além de solucionar os conflitos surgidos no seio da sociedade entre os cidadãos ou entre estes e o Estado, atribuindo a essa decisão os requisitos da imperatividade e definitividade.

 Com efeito, para dar fiel cumprimento a essa finalidade de solucionar definitivamente os conflitos sociais, atribuída ao Poder Judiciário, o Estado deve atribuir ao cidadão a prerrogativa de pleitear junto ao órgão jurisdicional a tutela jurídica de seus direitos ao constatar a ocorrência de sua violação por outrem. Consequentemente, o princípio do livre acesso ao Judiciário deve estar elencado dentre os direitos fundamentais conferidos ao cidadão, sob pena de desvirtuamento da função judicante e inviabilização da efetiva proteção aos direitos fundamentais do cidadão.

O direito de ação, sem sombra de dúvidas, se torna verdadeiro alicerce que protege o mínimo existencial do cidadão, pois, uma vez abolida a justiça privada, cabe apenas ao Poder Judiciário conhecer dos conflitos sociais e garantir, no caso concreto, a efetivação do direito violado ou ameaçado por outrem.

Assim, em que pese o direito de ação ser genérico e abstrato, ou seja, desvinculado do direito material discutido, não se pode negar que ambos estão intimamente ligados, surgindo desse pressuposto o interesse de agir que, dentre as condições da ação, é a necessidade e utilidade da tutela jurisdicional adequada à proteção do direito material violado.

Luiz Guilherme Marinoni dissertando sobre o direito fundamental de ação é categórico ao afirmar que:

O direito de ação cobre a multifuncionalidade dos direitos fundamentais, ou seja, pode ser utilizado conforme as necessidades funcionais dos direitos fundamentais. Portanto, é um direito que se coloca sobre todas essas funções e, na verdade, sobre todos os direitos fundamentais materiais. É que os direitos fundamentais materiais dependem, em termos de efetividade, do direito de ação (2008, p. 205).

E arremata o processualista:

O direito fundamental de ação repercute sobre o Estado de forma diferente.. Esse direito não incide sobre o Estado para, a partir dele, ser projetado sobre as relações particulares, mas sim para vincular o seu modo de atuação, isto é, para vincular a maneira como o Estado deve proceder a efetividade da proteção dos direitos (2008, p. 207).

Essa nova fase da efetivação dos direitos fundamentais vem sendo difundida pela doutrina moderna como “neoconstitucionalismo”, ao passo que, essa teoria, quando vocacionada à efetivação dos direitos fundamentais processuais, ganha contornos e denominação de “neoprocessualismo”.

Assim, o neoprocessualismo, construído com base na teoria dos direitos fundamentais processuais, deve ser analisado no sentido de dar efetivação e amplitude de acesso aos órgãos do Poder Judiciário, sempre que o direito material da parte sofra lesão ou ameaça, seja por outro particular, seja pelos agentes públicos. 

A Constituição Federal de 1988 elencou vários direitos e garantias em seu Título II, dentre eles, o direito fundamental à tutela jurisdicional, através do qual necessariamente o Poder Judiciário deve se posicionar diante da ocorrência de lesão ou ameaça a direito. O direito fundamental à tutela jurisdicional ou princípio da inafastabilidade da jurisdição encontra-se insculpido no art. 5º, inciso XXXV, do texto constitucional, nos seguintes termos:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos seguintes termos:

XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.

A regra demonstra, de forma inequívoca, que o Judiciário não pode se eximir de solucionar os litígios que lhe são apresentados, mesmo que a matéria suscitada não possua disciplina legal, como ocorre nos casos de mandado de injunção, ou tenha a lei, possivelmente aplicável ao caso, sido declarada inconstitucional por incompatibilidade vertical com o texto constitucional, através do controle de constitucionalidade difuso ou concentrado.

Com efeito, o comando normativo também se dirige ao legislador infraconstitucional que, no exercício da função legiferante não pode editar normas que venham a restringir o acesso à justiça, sob pena de declaração de inconstitucionalidade da norma legal.

Não se pode negar que a consagração de direitos fundamentais processuais no texto constitucional refletiu grande avanço do jurisdicionado na defesa de seus interesses, principalmente frente aos arbítrios cometidos pelo Estado sob o manto de atuar baseado no princípio da legalidade.

Desta feita, pode-se dizer que o direito de ação não abrange apenas a necessidade de postular judicialmente a efetivação dos direitos fundamentais, mas, sobretudo, como desdobramento lógico, abrange o direito ao contraditório e ampla defesa, direito à produção de provas, possibilidade de recurso das decisões, etc.

Assim, sobre os princípios constitucionais a serem respeitados, deve ser ressaltado a necessidade de obediência ao devido processo legal, seja no âmbito judicial ou administrativo, entendido aqui como a análise correta e acurada do pedido formulado pelo segurado, obedecendo-se o direito ao contraditório e ampla defesa, mediante a possibilidade de produção de provas. Tais direitos estão positivados no art. 5º, incisos LIV e LV, da Constituição Federal:

LIV – ninguém será privado de seus bens sem o devido processo legal;

LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes; 

A professora Lídia Elizabeth Gama afirma a fundamental importância do devido processo legal no ordenamento jurídico pátrio: 

No nosso sistema jurídico o princípio do devido processo legal é o princípio mais relevante do processo civil, e ele está integrado por muitos outros princípios, quais sejam: o princípio da justiça, o princípio da igualdade, o princípio da legalidade, o princípio do direito ao contraditório e ampla defesa, aos meios e recursos a ela inerentes, princípio da universalidade da jurisdição e o princípio da segurança jurídica (2005, p. 87). 

Destarte, o princípio do livre acesso à justiça, conforme consagrado no texto constitucional, reflete as reais necessidades de tutela e implementação dos direitos sociais dos cidadãos, principalmente frente à omissão dos entes estatais em implementá-los de plano, sem a intervenção do Poder Judiciário. Por outro lado, ao Poder Judiciário incumbe a correta aplicação da lei ao caso concreto, mediante a fiscalização e revisão dos atos administrativos praticados pelos agentes públicos no exercício da função que causem lesão ou ameaça a direito dos cidadãos.    

Sob o enfoque constitucional da inafastabilidade da jurisdição (art. 5º, inciso XXXV, da CF/88), nos casos em que há o indeferimento administrativo do benefício, mesmo tendo o segurado direito à sua percepção, há uma evidente ilegalidade a ser corrigida pela atuação do Poder Judiciário.

Na contraposição entre o direito de ação constitucionalmente garantido e a análise das condições da ação, deve prevalecer à proteção ao direito de ação, seja pelo critério de hierarquia das normas, seja em razão da nova ordem jurídica implementada pela Constituição Federal de 1988.

Visualiza-se, portanto, que a apreciação judicial do direito da parte, a despeito da deficiente análise realizada pelos entes gestores da Previdência Social, acaba por concretizar o princípio da inafastabilidade da Jurisdição, inclusive pelo fato de nem mesmo ser possível sua supressão através de emenda constitucional, por força da vedação insculpida no art. 60, §4º, inciso IV, da Constituição Federal, o qual aduz que “não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir os direitos e garantias fundamentais”.

Por outro lado, imprescindível a constatação de que a inovação infraconstitucional do ordenamento jurídico pátrio, no sentido de suprimir o livre acesso o Judiciário, padece de flagrante inconstitucionalidade, mutatis mutandis, a decisão judicial que extingue o processo sem exame do mérito, baseando-se na falta de interesse de agir ou outra condição da ação em razão da ausência de requerimento administrativo prévio, também se encontra em confronto com o texto constitucional.

A análise da possibilidade de postular judicialmente o benefício previdenciário sem o prévio requerimento administrativo perpassa pela abordagem da inafastabilidade da Jurisdição em contraposição com o clássico conceito de lide, caracterizado pela pretensão jurídica resistida e levada junto ao órgão jurisdicional para que se ponha fim à controvérsia.

Pelo clássico conceito de lide desenvolvido por Carnelutti esta se funda numa pretensão formulada em juízo por uma das partes e resistida pela outra, submetendo o litígio ao Estado/Juiz a fim de solucionar o feito.

O litígio, segundo esse entendimento, surge no momento em que o autor exige um direito que lhe assiste e não há um cumprimento voluntário e espontâneo por parte do réu, havendo a necessidade de submeter o litígio a um terceiro imparcial para que decida o mérito da demanda de forma imperativa e definitiva.

Assim, a doutrina dos seguidores de Liebman, principalmente Alfredo Buzaid, este também na qualidade de autor do projeto do atual Código de Processo Civil, aduz que a inexistência de pretensão resistida em juízo conduz o feito à falta de interesse de agir, sendo tal desiderato uma das condições da ação, conforme expressamente prevê o art. 3º do Código de Processo Civil: “para propor ou contestar ação é necessário ter interesse e legitimidade”.

Da mesma forma, a ausência de interesse de agir conduz à extinção do processo sem exame do mérito, nos termos do art. 267, inciso VI, do diploma retromencionado: “Art. 267. Extingue-se o processo, sem exame do mérito: VI – quando não concorrer qualquer das condições da ação, como a possibilidade jurídica, a legitimidade das partes e o interesse processual”.

Apegados à literalidade do dispositivo legal em comento, boa parte da doutrina e jurisprudência sustenta a impossibilidade de concessão de benefício perante o Poder Judiciário sem prévio requerimento administrativo que expresse a negativa da Previdência Social quanto ao pedido formulado. Nesse sentido já decidiram, por reiteradas vezes, os Tribunais Regionais Federais:

Previdenciário. Concessão de Benefício. Aposentadoria por idade. Trabalhador Rural. Ausência de prévio Requerimento Administrativo. Indispensabilidade de prévio Requerimento Administrativo. Em se tratando de concessão de benefício previdenciário, é indispensável, para o ajuizamento da ação, o prévio requerimento administrativo. É que não se pode transformar o Judiciário, que não dispõe de condições técnicas para o exercício da função cometida ao administrador (pessoal, aparelhamento, sistemas de contagem de tempo de serviço etc.), em balcão de requerimentos de benefícios (TRF da 4ª Região, 5ª Turma, Apelação Cível nº. 2001.70.07.001466-3, j. 05.09.2002, Relator Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz).

Processual Civil e Previdenciário. Indeferimento da Petição Inicial. Interesse de Agir. Exigência de prévia postulação administrativa. Jurisprudência reinante. Novas circunstâncias histórico-sociais que reclamam mudança neste posicionamento. O Direito é realidade cultural e, portanto, não se esgota em seu sentido normativo, estando sujeito também a considerações de ordem axiológica e sociológica. O que justificou o entendimento, dominante, de que é dispensável a prévia postulação administrativa, como condição para a propositura de ação previdenciária, foi a notória precariedade do serviço previdenciário, em passado próximo, que impunha autêntico calvário aos segurados, quase sempre com resultado negativo. Melhoria dos serviços, nos últimos tempos, que afasta aquela premissa. Por outro lado, há que se reconhecer o caos que vem sendo gerado pela facilidade de acesso ao Poder Judiciário, o que tem redundado em abuso do direito de ação e no descaso das partes autoras ao invocar a tutela jurisdicional, não raro com processos mal instruídos e desordenados, prejudicando a segurança do magistrado para pronunciar seu julgamento. Circunstâncias que autorizam a não observância da jurisprudência que vem predominando. Apelação a que se nega provimento. TRF da 3ª Região, 2ª Turma, Apelação Cível nº, 1999.03.99.073903-4/SP, j. 16.06.2003, Relator Juiz Federal Convocado Rubens Calixto).

Denota-se que dentre os argumentos sustentados pela jurisprudência destaca-se: a) a ausência de interesse de agir, condição da ação essencial para análise do mérito; b) a sobrecarga de processos perante o Judiciário, sob pena de transformá-lo em “balcão de benefícios”; c) ausência de necessidade e utilidade do processo judicial, uma vez que o direito do segurado poderia ser tutelado em sede administrativa.

Inobstante a posição ventilada, prevalece o entendimento de que é dispensável o requerimento administrativo para postular em juízo a concessão do benefício, tendo em vista a mitigação sofrida pela teoria das condições da ação, mediante a adequação de seu conteúdo ao direito processual constitucional.

Com efeito, nenhum dos argumentos trazidos pela doutrina e jurisprudência se sustentam frente ao princípio constitucional do livre acesso ao Judiciário, sob o enfoque de proteção dos direitos fundamentais.

Numa primeira abordagem, o requisito interesse de agir como condição da ação para o exercício do direito constitucional de ação não pode ser resumido apenas à exigência de prova documental do requerimento administrativo prévio de benefício, sob pena de desvirtuamento da função jurisdicional que visa tutelar, no caso concreto, os direitos dos cidadãos.

Ademais, o magistrado deve estar sensível aos desmandos cometidos pelas agências previdenciárias, inclusive quanto à demora no atendimento das ordens proferidas pelo Judiciário e que devem ser cumpridas pelo INSS.

Em verdade, o julgador ao constatar que o contexto de atendimento exercido pela Previdência Social na localidade é precário, retratado por ausência de servidores ou falta de qualificação destes na análise dos requisitos legais dos pedidos formulados, grandes quantidades de demandas judiciais por negativas de concessão dos benefícios em sede administrativa, demora ou ineficiência no cumprimento de ordens judiciais pelo órgão previdenciário, são fatores que presumem a necessidade de tutela do direito posto em juízo pelo segurado.

Como se isso não bastasse, ao longo dos anos, as condições da ação, no modelo tradicional proposto no atual Código de Processo Civil, sofreram algumas mitigações, quanto à sua interpretação, principalmente frente ao texto constitucional de 1988.

A aplicação da teoria da asserção também é um dos principais fundamentos para a aceitação da possibilidade do segurado buscar diretamente perante o órgão jurisdicional a tutela do direito ao benefício previdenciário. 

A teoria da asserção ou prosopettazione busca adequar a análise das condições da ação sob o enfoque do moderno processo civil, em respeito aos princípios constitucionais. Para Alexandre Freitas Câmara “a teoria da asserção permite ao juiz raciocinar admitindo, provisoriamente, e por hipótese, que todas as afirmações do autor são verdadeiras, para que se possa verificar se estão presentes as condições da ação” (2006, p. 133).

Da mesma forma, o escopo da jurisdição é a tutela dos direitos fundamentais através do direito de ação é de índole constitucional, servindo de instrumento ao direito material, garantindo assim a sua implementação. Nesse sentido temos Humberto Theodoro Júnior, em lição que jamais estará ultrapassada, quando aduz:

Instrumentalismo e efetividade são idéias que se completam na formação do ideário do processualismo moderno. Para ser efetivo no alcance das metas de direito substancial, o processo tem de assumir plenamente sua função de instrumento. Há de se encontrar na sua compreensão e no seu uso a técnica que se revele mais adequada para que o instrumento produza sempre o resultado almejado: “a solução das crises verificadas no plano do direito material é a função do processo” de sorte que quanto mais adequado for para proporcionar tutela aos direitos subjetivos de natureza substancial, mais efetivo será o desempenho da prestação estatal operada por meio da técnica processual (2007, p.20).

A função do processo é a proteção do direito material, tutelando o interesse dos cidadãos. Imaginar um processo dissociado de sua finalidade social é dar vida a um instituto vazio e desnecessário. A esse respeito, Luiz Guilherme Marinoni ensina que:

A jurisdição tem o dever de proteger ou tutelar todos os direitos, sejam fundamentais ou não. Porém, dizer que a jurisdição deve atender ao direito material pode significar, simplesmente, que o processo deve acudir aos direitos atribuídos aos cidadãos pelas normas materiais, o que não expressa algo muito relevante, a não ser um clichê que vem sendo utilizado pelos processualistas para dizer algo que é correto, porém óbvio e destituído de importância, especialmente quando se almeja uma dogmática capaz de permitir a efetiva retomada dos laços entre o processo civil e o direito material (2008, p. 243).

E por fim, ressalte-se que o direito processual previdenciário, em razão das peculiaridades trazidas pelo direito material, possui características próprias e que devem ser analisadas desvinculadas do direito processual civil, garantindo, assim, a efetividade deste leque de situações jurídicas que se propõe a tutelar, não sendo cabível submetê-lo aos ditames do processo civil indistintamente.

A HIPOSSUFICIÊNCIA DO SEGURADO E A DEFICIÊNCIA ESTRUTURAL DA PREVIDÊNCIA SOCIAL NA ANÁLISE DOS REQUERIMENTOS ADMINISTRATIVOS

A Emenda Constitucional nº 19/1998 inseriu no caput do art. 37, o princípio da eficiência no serviço público, sendo tal princípio norteador da atuação dos agentes públicos e dos órgãos estatais.

No âmbito da Previdência Social, a efetivação do princípio em tela se concretiza com a prestação de um atendimento de qualidade aos segurados e a correta análise das condições para a percepção, manutenção e cessação dos benefícios requeridos.  

A análise do preenchimento das condições para o deferimento do pleito requerido, caso a caso, demanda tempo, conhecimento da legislação previdenciária e correta verificação dos documentos apresentados pelo segurado.

Inobstante os critérios elencados, atualmente, os servidores das agências previdenciárias não possuem condições técnicas suficientes para uma correta análise das pretensões que lhes são apresentadas diariamente.

Hodiernamente o atendimento é feito por técnicos administrativos, sem formação jurídica, o que dificulta inclusive a compreensão acerca das leis previdenciárias quanto aos requisitos para concessão, cessação ou manutenção dos benefícios.

Os problemas perante as agências previdenciárias são de toda ordem, desde a falta de servidores frente à demanda de trabalho, passando pela ausência de treinamento adequado aos servidores já incorporados ao ente público, falta de padronização dos procedimentos de análise dos requerimentos, deficiência na estrutura física das agências de atendimento, dentre outros.

Consequentemente, todos esses fatores colaboram para que o atendimento perante as agências previdenciárias se torne insustentável, ensejando uma atuação eficaz dos órgãos integrantes do Poder Judiciário a fim de corrigir essas distorções e ofensa aos direitos dos segurados. 

Denota-se, portanto, que os postos de atendimento do INSS não possuem estrutura física e material humano qualificado a fim de prestar um serviço de qualidade ao segurado, fugindo da eficiência constitucional, distorções essas que são corrigidas pelo Poder Judiciário quando suscitado.

A situação é tão gravosa que há casos em que, mesmo após o reconhecimento do pleito em juízo e fixação de prazo para implantação do benefício, há uma demora injustificada por até meses, à revelia das ordens judiciais, demonstrando que a má prestação do serviço público desafia até mesmo o Poder Judiciário e a imperatividade de suas decisões. 

Não se pode negar que o principal problema a ser enfrentado pelo Judiciário não é a existência ou não de prévia postulação administrativa dos benefícios e sim uma atuação eficiente no combate à má prestação do serviço público pela Previdência Social, alinhado aos princípios da eficiência, legalidade e moralidade administrativa. 

Assim, há casos em que a probabilidade de negativa da Previdência Social é muito grande, seja por qualquer dos fatores já expostos, devendo ser admitida a postulação diretamente em juízo do pedido de concessão do benefício.

Nesse sentido o entendimento de José Antônio Savaris em sua obra Direito Processual Previdenciário:

Segundo esse entendimento jurisprudencial, se há forte presunção de que a entidade previdenciária indeferirá a prestação previdenciária objeto de apreciação judicial, é admissível o ajuizamento direto do pedido de concessão de benefício previdenciário, não se justificando a exigência do óbvio, isto é, da prova do indeferimento administrativo. Como existem alguns pedidos a respeito dos quais se presume o indeferimento ilegítimo pela Administração Previdenciária, estaria justificado o acesso ao Judiciário com fundamento na ameaça de lesão ao direito do indivíduo (2011, p. 212).  

Outro ponto de fundamental importância e que gera o descrédito da Previdência Social para com os segurados é o setor de perícias médicas. Com efeito, é de se ressaltar que o contingente de peritos médicos para análise de incapacidade laboral do segurado é muito reduzido frente à demanda de trabalho nas agências de atendimento da Previdência Social.

A falta de médicos, alinhado ao grande número de segurados a serem periciados, faz com que as perícias sejam realizadas em tempo exíguo, não havendo uma análise acurada da situação de cada segurado, o que gera, na maioria dos casos, o indeferimento do pedido de concessão do benefício sob alegação de que o segurado não possui incapacidade ou não preenche os requisitos para a concessão do auxílio doença ou aposentadoria por invalidez.

Da mesma forma, nos casos de negativa em sede administrativa quando a perícia médica concluiu pela inexistência de incapacidade do segurado, não há a elaboração de um laudo pericial mediante quesitos formulados pelas partes, o que dificulta a impugnação específica dos pontos examinados pelo perito médico possibilitando à parte interpor recurso administrativo da decisão ou requerer a revisão de sua situação por outro perito médico.

Nos casos de realização de perícia médica judicial há a formulação de quesitos pelas partes e pelo Juízo, onde, necessariamente o perito judicial deve apreciar as formulações propostas, como, por exemplo, a análise da ocorrência de incapacidade para as atividades anteriormente desenvolvidas pelo segurado ou para toda e qualquer atividade laborativa.  

Da mesma forma, é possível solicitar esclarecimentos do perito em audiência, confrontando sua análise com outros elementos fáticos e técnicos, como por exemplo, laudos e exames anteriores, influindo no convencimento do julgador.

Assim, não se pode negar que a análise dos requisitos para a concessão de benefícios previdenciários em sede judicial é feita de uma forma mais acurada, garantindo-se ao segurado o exercício mais efetivo do direito ao contraditório e a ampla defesa, podendo discutir toda matéria versada nos autos. 

Deve ser considerado que o atendimento prestado pela Previdência Social ao segurado, em casos de negativa de concessão do benefício, em muitas ocasiões não há a motivação necessária para que o ato seja impugnado legalmente, além da negativa de formalização do requerimento no sistema informatizado e fornecimento ao segurado de documentos que comprovem a negativa administrativa e possam embasar o ajuizamento de ação judicial.

Este é mais um fator que justifica o recebimento da petição inicial e regular processamento do feito até que seja proferida decisão de mérito, tendo em vista o indeferimento em sede administrativa juntamente com a negativa de fornecimento dos documentos relativos ao processo administrativo previdenciário do segurado.

Parcela da doutrina sustenta que é imperiosa a negativa em processo administrativo, pois, nesses casos, há submissão à apreciação judicial apenas daqueles pontos em que haja controvérsia, não necessitando o julgador apreciar os fatos incontroversos no âmbito administrativo.

Contudo, em que pese o entendimento exarado, tal fator é de flagrante irrelevância prática, pois é sabido que em praticamente todos os casos a controvérsia gira em torno da verificação da qualidade de segurado e do preenchimento dos requisitos para a concessão do benefício.

Assim, nos casos em que a Previdência nega administrativamente o benefício ao segurado ou nos casos de postulação direta perante o Judiciário, necessariamente o julgador terá que se debruçar sobre esses dois fatores, independentemente de já terem sido apreciados ou não pelo INSS.

Da mesma forma, é sabido que, ao proferir sentença de mérito previdenciária, o juiz necessariamente deve enfrentar todos os temas pertinentes ao segurado e ao benefício suplicado, como por exemplo, legitimidade de parte, qualidade de segurado, preenchimento dos requisitos para concessão do benefício, qualidade de dependente do segurado e incapacidade para o trabalho, caindo por terra a tese que sustenta a necessidade de requerimento administrativo prévio.

Desta feita, a conclusão de que a falta de análise administrativa relega ao julgador a análise de todos os pontos da controvérsia é inverídica, pois, necessariamente, em todos os feitos, há necessidade de ser feito esse exame, sob pena de nulidade da sentença proferida por ausência de fundamentação ou até mesmo a possibilidade de interposição de embargos de declaração visando sanar a omissão do decisum.

Outro ponto lapidar que justifica a tese aqui encampada é no sentido de que ao cidadão não é razoável exigir-se que tenha condições de pleitear junto aos órgãos estatais em pé de igualdade com o ente público, ainda mais em se tratando de benefício previdenciário quando o postulante geralmente é pessoa idosa, de baixa instrução cultural, acometido de doença grave ou lesão que o torne incapacitado para o trabalho, ou, ainda, em se tratando de segurado especial na condição de trabalhador rural que desenvolve seus trabalhos em atividades essencialmente braçais, não dispondo de conhecimentos técnicos ou jurídicos.

Desta forma, é sabido que na sistemática atual da Previdência Social, o deferimento dos benefícios em sede administrativa decorre da análise do preenchimento dos requisitos pelos segurados, conforme previsão da legislação previdenciária vigente. Não se pode desconsiderar, portanto, a complexidade dos requisitos para o deferimento dos pedidos formulados administrativamente com a consequente concessão do benefício pleiteado.

Os segurados, em sua maioria, são pessoas humildes e desprovidas de conhecimento técnico acerca do preenchimento ou não dos requisitos para a concessão do benefício, ao passo que, em não raras ocasiões, sequer chega a ser instaurado um procedimento administrativo perante o INSS para análise do pleito, pois o servidor apenas informa o não preenchimento dos requisitos e nem mesmo fornece ao segurado documentos que comprovem a negativa do pedido administrativo ou mesmo propiciam o protocolo do pedido.

Não se pode negar que devido à falta de servidores, algumas agências da Previdência Social utilizam um servidor com a finalidade de “filtrar” os atendimentos, ou seja, o servidor se coloca na entrada da agência e faz uma breve análise da documentação trazida pelo segurado, proferindo, de plano, um julgamento sobre a possibilidade ou não de concessão, sendo que, na maioria das vezes o pleito é indeferido ali mesmo, verbalmente, e não há sequer um registro do segurado e a formalização de seu requerimento.

A postura adotada nessas agências do INSS, além de ser passível de responsabilização civil e penal pelo descumprimento do dever funcional de prestar um atendimento de qualidade ao cidadão mediante adoção dos procedimentos previstos em lei, relega ao Judiciário a análise dos benefícios requeridos.

Deve ser ressaltado que hodiernamente há uma profunda falta de conhecimento dos segurados acerca de seus direitos e a correta forma de pleiteá-los perante os órgãos previdenciários, situação esta que reflete na prestação de serviço público aquém do almejado pela sociedade, ensejando a atuação do Judiciário para que sejam corrigidas tais dissonâncias.

Portanto, exigir o prévio requerimento administrativo do segurado nessas condições, que, diga-se de passagem, tem se tornado a regra nas agências da Previdência Social, é inviabilizar totalmente o acesso do segurado ao direito à previdência, conforme previsto no texto constitucional.

O julgador, diante do pedido formulado em juízo sem o prévio requerimento administrativo, deve estar atento a todos esses fatores, sob pena de se tornar um legalista extremado que fixa os olhos apenas na lei em detrimento de assegurar e garantir de um mínimo existencial aos cidadãos.

O ENTENDIMENTO DOS TRIBUNAIS QUANTO À AUSÊNCIA DE REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO PARA A CONCESSÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO

Conforme já amplamente consignado, a possibilidade de pleitear o benefício perante o Judiciário, a despeito da ausência de requerimento administrativo prévio, encontra respaldo principalmente no princípio constitucional do livre acesso à justiça.

Da mesma forma, restou demonstrado que a teoria das condições da ação, no modelo proposto originalmente no Código de Processo Civil, não encontra fundamento jurídico válido quando analisada em contraposição com o direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva e tempestiva. Na ponderação de interesses, prevalece o mandamento constitucional em detrimento da norma infraconstitucional que prega a extinção do processo sem exame do mérito por falta de interesse de agir.

E também não se pode negar que as deficiências na atuação da Previdência Social na correta análise do pleito formulado pelo segurado enseja a busca da tutela do direito em sede judicial, devendo o julgador estar atento a esses fatores, sob pena de se tornar um aplicador da letra fria da lei, em total dissonância dos fatores sociais, morais e financeiros dos cidadãos e do ente estatal.

Assim, fazendo uma abordagem ampla dos fundamentos trazidos para a possibilidade de pleitear judicialmente o benefício, sem o prévio requerimento administrativo, num primeiro momento tem-se o fundamento constitucional baseado no princípio do livre acesso à justiça. Em segundo plano deve ser considerado o fundamento legal de inaplicabilidade das condições da ação, como forma de vedar ou limitar o direito de ação e tendo em vista a sua incompatibilidade com o texto constitucional.

E, por fim, ressalta-se o fundamento de ordem prática consignado na incapacidade da Previdência Social prestar um atendimento de qualidade aos segurados, caindo o órgão público em descrédito para com a sociedade que passa a buscar na tutela jurisdicional a correção para a má atuação da Previdência Social.

Com base nesses fundamentos, a jurisprudência dos tribunais tem aceitado de forma ampla o ajuizamento da ação previdenciária sem a prova do prévio requerimento administrativo e a negativa do órgão previdenciário.  

Contudo, tal entendimento não é pacífico. Em alguns pontos a jurisprudência pátria oscila quanto à possibilidade ou não de buscar a tutela jurisdicional requerendo o benefício previdenciário independentemente do prévio requerimento administrativo.

Numa primeira análise temos a súmula 213 do já extinto Tribunal Federal de Recursos ao pregar que "O exaurimento da via administrativa não é condição para a propositura de ação de natureza previdenciária".

Denota-se que a súmula em comento traz apenas a desnecessidade de esgotamento das vias administrativas, sem adentrar na questão do ajuizamento direto da ação previdenciária em sede judicial sem a parte postular previamente em requerimento administrativo.

No mesmo sentido, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região, através da Súmula de nº 09, orienta que: “Em matéria previdenciária, torna-se desnecessário o prévio exaurimento da via administrativa, como condição de ajuizamento da ação”.

Por outro lado, no Superior Tribunal de Justiça vem prevalecendo o entendimento de que é desnecessário requerer administrativamente o benefício, podendo o Judiciário conhecer desde logo do litígio e proferir decisão de mérito. Senão vejamos:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. INGRESSO NO PODER JUDICIÁRIO. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. DESNECESSIDADE. PENSÃO. PENSÃO ESPECIAL EX-COMBATENTE. MORTE DO AUTOR NO CURSO DO PROCESSO. EXECUÇÃO. HABILITAÇÃO DA VIÚVA COMO PENSIONISTA. TERMO INICIAL NA AUSÊNCIA DE REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO: DATA DO AJUIZAMENTO DA AÇÃO. PRECEDENTES. IMPOSSIBILIDADE. ANÁLISE DE DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. IMPOSSIBILIDADE NA VIA DO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ENUNCIADO 213 DO EXTINTO TRIBUNAL FEDERAL DE RECURSOS. DESCABIMENTO. 1. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que não se pode condicionar a busca da prestação jurisdicional à prévia postulação administrativa. 2. O título executivo judicial conferiu ao de cujus o direito à pensão especial de ex-combatente, mas não examinou, em momento algum, o preenchimento pela viúva deste das condições legais necessárias à concessão do benefício. Tal desiderato somente poderá ser alcançado mediante requerimento administrativo próprio, ou, pela apreciação do Poder Judiciário. 3. Não havendo requerimento administrativo, a fixação do termo inicial do pagamento do benefício dar-se-á na data do ajuizamento da ação. 4 A via especial, destinada à uniformização da interpretação da legislação infraconstitucional, não se presta à análise de possível violação a dispositivos da Constituição da República. 5. Os verbetes ou enunciados dos tribunais não se equiparam às leis federais para fins de interposição de recurso especial. 6. Recurso especial desprovido. (RESP 200602614064, LAURITA VAZ, STJ - QUINTA TURMA, 02/06/2008) 

PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL CONTRA DECISÃO QUE DEU PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. ANÁLISE. IMPOSSIBILIDADE. DESNECESSIDADE DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO COMO REQUISITO PARA O AJUIZAMENTO DE AÇÃO EM QUE SE PLEITEIA A CONCESSÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL DO INSS DESPROVIDO. 1. A análise de matéria de cunho constitucional é, por força do art. 102, III da Carta Maior, exclusiva da Suprema Corte, sendo, portanto, vedado a este Superior Tribunal de Justiça conhecer da suposta infringência, ainda que para fins de prequestionamento. 2. As Turmas que compõem a 3a. Seção desta Corte já pacificaram o entendimento de que a ausência de prévio requerimento administrativo não constitui óbice para que o segurado pleiteie judicialmente a concessão de seu benefício previdenciário. 3. Agravo Regimental do INSS desprovido. (AGRESP 200900998873, NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, STJ - QUINTA TURMA, 14/02/2011). 

Ademais, não se pode negar que o direito ao acesso à justiça busca tutelar a necessidade de apreciação da lesão ou ameaça a direito, sendo fatores distintos a serem considerados pelo julgador na apreciação do caso concreto.

A doutrina também não se abala ao afirmar tal desiderato:

De qualquer sorte, se é forte a presunção de que o INSS indeferirá determinado benefício previdenciário, porque ostensivo o descompasso entre o proceder administrativo e consagrada orientação jurisprudencial, é possível o ajuizamento direto da ação de concessão de benefício previdenciário, hipótese em que a data do ajuizamento da ação se substituirá à do requerimento administrativo para todos os efeitos legais (SAVARIS, 2011, p. 213). 

A lesão ao direito se efetiva quando o responsável pela implementação do direito se nega de forma sistemática a legitimá-lo. Nesse caso, incumbe ao titular do direito violado o ônus da prova do fato constitutivo de seu direito e da sua não implementação em razão da negativa de outrem a quem incumbia tal dever.

Por outro lado, a ameaça ao direito ocorre quando haja fundado receio de que a não intervenção do órgão jurisdicional acarretará danos irreparáveis ao cidadão, autorizando a imediata intervenção judicial no caso concreto, independentemente da negativa expressa daquele a quem cabia implementar o direito, sob pena de ineficácia do provimento final frente a ausência de atuação ou demora na apreciação judicial.

Assim, nas ações onde se postula a concessão de benefícios previdenciários, a lesão ao direito do segurado ocorre diante da negativa do órgão previdenciário em apreciar e conceder o benefício, onde, na maioria dos casos, sequer há o correto registro do segurado nos sistemas do INSS e emissão de requerimento administrativo atestando a decisão denegatória.

A ameaça ao direito do segurado ocorre quando não há nem mesmo o atendimento do segurado pelos agentes previdenciários, ou seja, diante da demora ou impossibilidade de agendamento de atendimento por falta de servidores no órgão, falta de agência da Previdência Social na localidade, congestionamento do sistema de informática, ausência de médicos peritos para análise das condições do segurado e inúmeros outros fatores de ordem prática que obstam o direito do segurado, autorizando a imediata intervenção do Judiciário a fim de tutelar de plano os direitos ameaçados ou violados. Nessa linha de entendimento a doutrina processual previdenciária afirma acertadamente: 

Na verdade o que caracteriza o interesse de agir não é a existência de um indeferimento administrativo, mas a ocorrência de lesão ou ameaça de lesão ao direito do indivíduo. Se essa proposição nos auxilia a responder a diversas indagações sobre o ”interesse de agir em matéria previdenciária”, ainda assim a dinâmica do direito material colocará novos problemas”. (SAVARIS, 2011, p. 68). 

O tema é de grande relevância teórica e prática, tendo a Previdência Social, através da Advocacia-Geral da União, suscitado o Supremo Tribunal Federal a se manifestar sobre a questão em sede de Recurso Extraordinário, tendo em vista o nítido caráter constitucional dos direitos envolvidos no litígio.

A questão discutida no Recurso Extraordinário nº 631.240/DF transcende a órbita de um grupo de segurados, tendo o Pretório Excelso reconhecido a repercussão geral da matéria, pelos critérios jurídicos, sociais e econômicos.

Por outro lado, em que pese o recurso em questão estar pendente de julgamento no mérito, é sabido que a decisão proferida em sede de recurso extraordinário não vincula os diversos órgãos e as várias esferas do Poder Judiciário, posto que cabe ao STF utilizar-se de mecanismos que garantam a observância de seu decisum, para fins de pacificação da jurisprudência e conceder segurança jurídica aos jurisdicionados.

Na tese sustentada, segundo a Procuradoria do INSS, surge para a parte requerente o direito de pleitear judicialmente o benefício após 45 (quarenta e cinco) dias do requerimento administrativo sem que a Previdência tenha apreciado o pleito do segurado.

Com devida vênia o posicionamento sustentado beira ao absurdo, pois, tendo em vista o caráter alimentar do benefício suplicado, a fixação de prazo para que se possa buscar a tutela judicial viola a dignidade da pessoa humana e os direitos sociais previstos no art. 6º do texto constitucional.

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